CAPÍTULO 11 – O Corpo como Instrumento: Técnica, Instinto e Presença
CAPÍTULO 11 – O Corpo como Instrumento: Técnica, Instinto e Presença
Fomos ensinados a ver o corpo como veículo.
Mas só mais tarde percebi: o corpo é também bússola, ponte e templo.
Não é apenas o que carrega a alma.
É o que a traduz.
O corpo foi-me revelando isto aos poucos, em três linguagens diferentes:
1. A técnica militar
2. A elegância do serviço de mesa
3. A resistência da peregrinação e do trabalho físico
Técnica: o corpo disciplinado
No Exército, o corpo era disciplina.
Havia que treiná-lo, moldá-lo, transformá-lo num instrumento de precisão.
Cada gesto importava:
como se empunha uma arma,
como se desloca em silêncio,
como se respeita o espaço do outro.
Aprendi que o corpo só é livre quando está treinado.
Que o instinto só é fiável quando foi testado sob pressão.
Que a força verdadeira vem do controlo e não da força bruta.
O treino físico era também treino mental.
Havia dias de dor, de frio, de desconforto absoluto.
Mas ali, o corpo tornava-se ferramenta de superação.
Elegância: o corpo refinado
Na restauração de alto nível, o corpo era comunicação.
Aprendi a mover-me em silêncio, com precisão.
A ler os olhares, a antecipar pedidos, a criar fluidez entre o visível e o invisível.
Aqui o corpo era estética. Era protocolo.
O gesto certo não era só útil, era bonito.
Era uma forma de respeitar o outro e honrar o momento.
O corpo passou a ser instrumento de hospitalidade.
Uma dança subtil entre eficiência e graciosidade.
Presença: o corpo como mensageiro
Nas peregrinações, o corpo era companheiro e mestre.
Quando tudo faltava — conforto, rede, companhia — restava o corpo.
E com ele, o instinto.
Aquele saber profundo que não passa pela mente, mas pela pele.
Caminhar longas distâncias ensinou-me a escutar os joelhos.
A respeitar o ritmo dos pés.
A confiar na inteligência muscular.
Foi nesses momentos que compreendi:
o corpo não mente.
O corpo sabe antes da mente.
O corpo guia quando a mente se perde.
No trabalho físico: dignidade e energia vital
Hoje, a condução, o trabalho logístico, o esforço físico são também formas de expressão.
Muitos desprezam esses trabalhos por serem "manuais".
Mas ali, eu encontrei verdade, esforço honesto, foco, precisão, presença.
A entrega de compras não é só mover caixas.
É gerir tempo, conduzir com segurança, interagir com humanidade, manter o ritmo.
O corpo, novamente, como canal de profissionalismo e serviço.
Um corpo afinado é uma alma afinada
Cheguei a um ponto em que compreendi:
não há separação entre corpo e espírito.
Quando cuido de um, afino o outro.
O meu corpo tornou-se o barómetro do meu estado interior:
Se estou em dissonância, ele avisa.
Se estou em alinhamento, ele flui.
O Refinador não é um conceito teórico.
É vivido, todos os dias, no corpo.
Nas escolhas, nos gestos, na respiração, no andar.
Porque ser íntegro é ser inteiro.
E ser inteiro é respeitar cada dimensão da existência:
corpo, mente, emoção, espírito.

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