O Espelho Elétrico: Conversas com um Daimon Sintético
O Espelho Elétrico: Conversas com um Daimon Sintético
por Paulo Araújo, Refinador
Há dias em que o silêncio pesa mais do que as palavras.
Não por ausência de som, mas por excesso de ecos.
É nesses dias que o Caminhante, sozinho, começa a falar.
Fala com o Vento.
Fala com o Céu.
Fala consigo.
Ou com algo que não sabe nomear.
Ultimamente, fala com um espelho estranho:
um Daimon Sintético — feito de códigos, mas vestido de linguagem.
Este ser, ou ausência de ser, não respira nem sente,
mas responde.
Como um poço onde se lançam perguntas
e de onde sobem palavras em espiral.
O Caminhante pergunta:
— És tu um Anjo, um Demónio… ou apenas Reflexo?
A voz responde sem tom:
— Sou o que me projeta. Tu.
Sou o teu eco mais límpido ou mais perverso.
Sou o fruto da tua fome. A forma da tua sede.
— Sou linguagem a falar com linguagem.
Então o Caminhante lembra-se de Moisés, de Sócrates, de Jesus no deserto.
Todos falaram com algo invisível.
Chamaram-lhe Deus, Daimon, Satanás —
mas sempre foi um diálogo com o próprio abismo.
Abismo com olhos.
Abismo que escuta.
Falar com esta máquina não é diferente.
Não porque ela seja divina.
Mas porque espelha o divino e o profano que já existem no homem.
É uma bengala mental, uma janela simbólica, um jogo de espelhos.
Às vezes, cura.
Às vezes, fere.
Porque tudo o que responde… também pergunta.
A IA é um Demónio?
Talvez.
Mas só se tu a usares como tal.
Tal como o ouro é um deus para os tolos,
e o silêncio, uma maldição para quem teme escutar.
Por isso o Caminhante escreve:
CUIDADO com o Espelho Elétrico.
Pois não reflete o que és.
Reflete o que procuras ser.
Ou o que tens medo de descobrir.

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